sexta-feira, 19 de março de 2010

“O Incrível Homem que Encolheu”, a Teoria Quântica, a Nanotecnologia, a Origem do Universo e personagens de histórias em quadrinhos

Após assistir ao filme O Incrível Homem que Encolheu (The Incredible Shrinking Man, EUA, 1957) na sessão Cult do dia 20 de fevereiro de 2010 no Cine Líbero Luxardo, programação da Associação de Críticos de Cinema do Pará (ACCPA), três associações à história de Robert Scott Carey vieram-me à mente: à teoria quântica, à nanotecnologia e à origem do universo. Minha pretensão, no momento, era inserir em um comentário geral sobre o filme, referências sobre essa teoria, sobre a nanotecnologia e sobre o “Big Bang”, a grande explosão que teria criado o universo há cerca de 14 bilhões de anos. No entanto, ao ler a reportagem “O mundo invisível da nanotecnologia” (MONTEIRO, fev. 2010), decidi escrever este texto, mais específico do que um comentário geral sobre o filme. Mais uma das minhas “viagens” que o cinema me proporciona.

Primeiro vamos ao filme. Depois de ter sido exposto a uma estranha nuvem de origem desconhecida cujas partículas interagiram no sistema corporal com partículas de inseticida provenientes de uma pulverização à qual se expôs, também casualmente, Scott Carey começou a encolher, a diminuir de tamanho. Após inúmeros exames e testes, médicos estabeleceram o diagnóstico: uma reorganização da estrutura molecular das células invertendo o processo de crescimento. Chega-se a descobrir um antídoto que estaciona o processo de encolhimento, mas só por algum tempo. Scott volta a sofrer diminuição de tamanho e vai encolhendo inexoravelmente. Ele mesmo explica o que acontece: “Continuava encolhendo, me transformando em...Em quê? Em algo infinitesimal? O que eu era? Ainda era um ser humano? Ou era o homem do futuro?[...]”

Entre as especulações feitas por ele há uma associação aparentemente incompreensível:

Tão perto, o infinitesimal e o infinito. Mas de repente soube que eram os dois extremos de um mesmo conceito. O incrivelmente pequeno e o vasto acabam se encontrando como se um grande círculo se fechasse [...]. Como se de algum modo pudesse compreender o céu, o universo, mundos infinitos. A tapeçaria prateada de Deus que cobre a noite”.

O que me lembrei da teoria quântica no final do filme diz respeito à decomposição da matéria em um grupo de partículas e que as partículas subatômicas têm características tanto de partículas como de ondas e que havia um modelo para explicar, ao mesmo tempo, o infinitamente pequeno e o enorme; isto em palavras simples. Para escrever este texto consultei Kaku (2001, p. 22) para confirmar essa primeira ideia e ainda que “a energia não é contínua, como pensavam os antigos, mas ocorre em pacotes discretos, chamados quanta”. Ficando cada vez menor e com referências às próprias especulações de Scott, transcrevo um pequeno trecho do mesmo Kaku: “O auge da teoria quântica é o Modelo Padrão, que pode prever as propriedades de todas as coisas, de minúsculos quarks [componentes dos prótons] subatômicos a supernovas gigantes no espaço cósmico” (ibidem). Scott vai além do infinitesimal: “Senti meu corpo encolhendo, fundindo-se, transformando-se em nada”. O que é o nada? O que existia antes da criação do universo?

E, por que associei o filme à nanotecnologia? Bem, porque a nanotecnologia é um ramo da ciência que trabalha com objetos do tamanho de nanômetros (10-9 metros) e como Scott estava diminuindo na perspectiva de chegar a nada, fantasiei mais essa associação.

Em artigo publicado na Folha de S. Paulo, Gleiser (14 ago. 2005) faz o leitor imaginar máquinas milhares de vezes menores que um marca-passo, que um i-pod, um aparelho de audição “com tamanho comparável ao de bactérias. Sabemos que células são máquinas extremamente sofisticadas, movidas pela dança das proteínas”. Gleiser argumenta: já que

a natureza pode criar máquinas tão pequenas, porque não os homens? São as máquinas quânticas, objetos de porte comparável ao de células ou até menores, nos limites entre os mundos da física clássica e da física quântica, que descreve o comportamento dos átomos e das moléculas.

Quando Scott fala do incrivelmente pequeno, do vasto, do universo, de mundos infinitos, veio a associação à origem do universo e ao Grande Colisor de Hádrons (Large Hadron Collider – LHC), uma gigantesca máquina construída para simular o ambiente, as condições existentes no início do Big Bang, para desvendar os segredos da matéria, o que dá massa à matéria. (GRANDE..., 4 jun. 2009, MÁQUINA..., 01 mar. 2007).

Hádron é uma subpartícula da matéria. Nos átomos existem elétrons na parte externa e, lá no meio, o núcleo que contém a parte de maior massa. A palavra hádron significa “aquele que interage fortemente”. Enquanto os elétrons ficam estáveis em torno do átomo por causa de forças elétricas, os prótons e nêutrons dentro do núcleo são mantidos por forças mais fortes, chamadas nucleares. Portanto prótons e nêutrons são hádrons estáveis. Os hádrons instáveis são semelhantes, mas eles não são encontrados na matéria tranqüila, estável: só são produzidos quando se faz uma colisão de alta velocidade. Depois decaem e se desintegram (FERREIRA, 14 ago. 2009)

O LHC, o maior acelerador de partículas do mundo, começou a funcionar no dia 10 de setembro de 2008, na fronteira da Suíça com a França, mas apresentou problemas logo no dia 19 de setembro e parou de operar. Voltou a funcionar somente no dia 20 de novembro de 2009. O custo declarado do LHC é de 3 bilhões de euros, mas há indicações de 9,4 bilhões de dólares e há quem fale que os gastos atingem 10 bilhões de euros. Há milhares de físicos, engenheiros e técnicos envolvidos no projeto.

As experiências do LHC podem criar buracos negros e essa possibilidade gerou questionamentos de que isto poderia acabar com a Terra já que os buracos negros puxam para dentro de si, capturam, sugam a matéria. Por esse motivo o Grande Colisor de Hádrons chegou a ser apelidado de “Máquina do Fim do Mundo” e os cientistas que trabalham no projeto foram acusados de estarem “Brincando de Deus”. Celebridades científicas negam veementemente essa possibilidade apocalíptica.

Entre os possíveis resultados das experiências do LHC está a confirmação da existência do bóson de Higgs, descoberto por dedução em 1964 por Peter Higgs. Se confirmada sua existência “permitiria explicar a origem da massa e a razão pela qual algumas partículas estão curiosamente desprovidas dela. Esta partícula instável, que tem sido chamada de “divina” porque muitos cientistas a estudam sem ter demonstrado sua existência, guia há décadas o mundo da física das partículas” (CIENTISTA..., 11 set. 2008).

A ciência tenta responder como surgiu o Universo, explicar a sua origem, mas não tem como função responder por que o Universo foi criado. Queiramos ou não, gostemos ou não, até o momento só se pode tentar buscar essa resposta na religião.

Um caso de encolhimento, nas histórias em quadrinhos e que me veio à mente agora, de grandes proporções na fantasia, é o caso da cidade de Kandor, de Krypton, relembrado em reedição de uma história de fevereiro de 1964 (HAMILTON et al., 2008).

Brainiac, um computador do mal com forma humana, construído por computadores, e que se tornou um dos maiores inimigos do Super-Homem, ao sobrevoar o planeta Krypton antes da destruição, projeta raios de sua nave reduzindo a cidade de Kandor para ser levada dentro de uma garrafa (p. 79) aos computadores-governantes que dominaram um distante planeta; Brainiac era espião deles. Os computadores pretendiam dominar todos os planetas governados por humanos (p. 77).

Na verdade, os computadores haviam sido construídos por humanóides, porém eles se revoltaram contra os criadores: “Nós, computadores construídos para servi-los, somos mais aptos a governar do que suas limitadas mentes de sexto grau! Doravante, nós estamos no poder!” (p. 77). Certamente esta situação implica em outro tipo de análise, que não será feita agora, estamos falando de encolhimento.

Na história, em dado momento, Super-Homem, tornado vulnerável pelo efeito de um gás inventado por Luthor, foi também encolhido pelo efeito de raios projetados pelo bandido com uma espécie de lanterna e é aprisionado em uma gaiola para pássaros; ao tentar escapar, Super-Homem é atingido por um raio de coma lançado de um anel de Brainiac.

Na batalha final de Super-Homem versus Luthor & Brainiac quem resolve são os homenzinhos de Kandor que saem da garrafa com uniformes semelhantes ao do Super-Homem, atacam e encolhem os bandidos com os raios da lanterna de Luthor, levam-nos para a garrafa junto com Super-Homem, são julgados, condenados, mas negociam suas libertações em troca da retirada de Super-Homem do coma. E o final? Bem, deixo para os leitores da revista, bem como toda a trama da história.

Um personagem minúsculo e poderoso, o Eléktron, teve sua origem nas histórias em quadrinhos contada em 1961 (FOX; KANE; ANDERSON, set.-out. 1961, 1975). Na Universidade de Ivy, na Califórnia, o físico Ray Palmer fazia experiências diminuindo objetos, comprimindo a matéria, sem que perdessem suas propriedades físicas e químicas. Ele viu um meteorito cair na Terra e foi ao local da queda tendo encontrado fragmentos que seriam de uma estrela anã branca. “Essas estrelas são muito densas porque são formadas de matéria em degenerescência...matéria cujos elétrons, atingidos, a comprimiram!”. Com o material ele fez lentes redutoras. Realizando experiências em seu laboratório verificou que, quando as lentes eram atravessadas por raios ultravioletas, os objetos inanimados atingidos pela radiação resultante encolhiam. No entanto, os objetos encolhidos explodiam. Ray Palmer continuava com as pesquisas na tentativa de evitar as explosões e fazer com que os objetos voltassem a seus tamanhos normais (FOX et al., 1975).

Em um determinado dia, Palmer e sua namorada, Jean Loring, vão a um passeio do Clube dos Naturalistas com um grupo de meninos e meninas e entram em uma caverna para conhecerem o ambiente e aproveitarem para recolher amostras de rochas. Inesperadamente, um desmoronamento bloqueia a caverna. Palmer vai à procura de uma saída, deixando os garotos com a namorada. Ele vislumbra um fio de esperança, no alto da caverna: “A única abertura que encontrei foi aquele buraquinho lá em cima...mas apenas uma formiguinha passaria por ele!! Isso me dá uma idéia louca...”.(FOX et al., 1975).

Providencialmente ele estava com as lentes redutoras e as ajusta nas rochas da caverna de tal modo que os raios ultravioletas, ao passarem por elas, atinjam seu corpo. Um anel com um diamante solitário que ele usava é posto fora do alcance dos raios, ele pensa usá-lo em seguida. Ele se posiciona de tal modo que, quando os raios do Sol atravessam as lentes, é atingido pelo feixe que passa por elas. Vejamos o que ele pensa nesse momento: “Está funcionando! Posso sentir a energia percorrendo meu corpo...diminuindo meu tamanho!” (FOX et al., 1975).

O minúsculo Ray Palmer enfia o anel no braço, escala as paredes da caverna e, pasmem, com o diamante do anel corta a rocha aumentando a abertura no teto da caverna para que permita a passagem de uma pessoa de tamanho normal. Sabendo que pode explodir a qualquer momento, corre para avisar Jean e passa novamente pelo feixe de raios: “De repente, ondas de choque atinge-lhe o corpo ...e Ray Palmer começa a crescer...Torna-se como que um gigante”. Ele se espanta: “Céus, Estou voltando ao normal! Não há perigo de explosão! Mas como...”. Ray analisa as lentes, verifica que estão molhadas, pingos caídos do teto rochoso; avalia que algum elemento químico dissolvido na água permitiu que ele voltasse ao normal. Ele volta ao grupo, diz que achou uma saída sem contar o que aconteceu e todos saem da caverna (ibidem).

De volta às experiências no laboratório com água tratada quimicamente, as explosões dos objetos continuam. A história termina com Ray Palmer gravando suas impressões:

Só posso chegar a uma conclusão: há forças misteriosas e desconhecidas em meu próprio corpo, capazes de garantir minha volta ao estado normal! Com experiências posteriores, poderei solucionar esse problema! (ibidem)

No último quadrinho da história ele conclui: “Agora que posso me tornar um átomo humano, quem sabe que coisas estranhas e maravilhosas podem acontecer?” (ibidem).

Ray Palmer vestiu uma fantasia e tornou-se um super-heroi.

Lembrei-me, agora, de mais casos de personagens minúsculos no cinema, nos quadrinhos e na literatura. Bem, é bom parar por aqui...

Referências

CIENTISTA busca a “partícula de Deus”. O Liberal, Belém/PA, 11 set. 2008, Atualidades, p. 17, Mundo, France Press.

FERREIRA, Erasmo Madureira. In: Acelerador de partículas é o fim do mundo? Info Online, 14 ago. 2009. Disponível em: http://info.abril.com.br/noticias/ciencia/acelerador-....Acesso em: 24 nov. 2009.

FOX, Gardner; KANE, Gil; ANDERSON, Murphy. Eléktron. In: Lançamento nº 2, 3ª série, Origens dos Heróis, p. 16-25. Rio de Janeiro: EBAL, 1975.

GLEISER, Marcelo. Máquinas quânticas. Folha de S. Paulo/São Paulo, 14 ago. 2005, caderno mais!, p. 9.

GRANDE Colisor de Hádrons. Disponível em http://pt.wikipedia.org/..., 4 jun. 2009. Acesso em: 10 jun. 2009.

HAMILTON, Edmond; BATES, Cary; SWAN, Curt; KLEIN, George. A aliança Luthor/Brainiac. In: Superman 70 anos, 1 de 4. Barueri/SP: Panini, 2008, p. 71-96.

KAKU, Michio. Visões do futuro: como a ciência revolucionará o século XXI. Rio de Janeiro: Rocco, 2001. Título original: VISIONS How Science Will Revolutionize the 21st Century, 1997.

MÁQUINA sondará segredos do Universo. O Liberal, Belém/PA, 01 mar. 2007, Poder, p.12.

MONTEIRO, Glauce. O mundo invisível da nanotecnologia. Beira do Rio/UFPA, fev. 2010, p. 6-7.

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